CRISPINA DOS SANTOS: (PARTE DA) VIDA E OBRA DE UMA ARTESÃ FEIRENSE




Crispina dos Santos nasceu em um povoado, chamado de Camundongo, próximo a Humildes, distrito de Feira de Santana -Ba, em 25 de outubro de 1927. A artesã, atualmente com 85 anos, viveu toda a sua infância na zona rural e foi com sua mãe que aprendeu a usar o barro, a fim de fazer objetos. Quando Crispina tinha sete anos de idade, porém, sua mãe, Lúcia Santos, morreu, forçando-a a vir morar em Feira de Santana-BA. Crispina também perdeu cedo seu pai, Marciniano de Jesus. Ela tem uma filha, Margarida Neuza Machado e na dissertação de mestrado de Vânia Bezerra de Carvalho, Crispina fala dela:


Quando ela era pequenininha, menina assim com dez doze anos, fazia um bocado de coisinhas miudinhas: panelinha, cachorrinho, e pintava tudo, quando ela ia pra feira e arrumava a banquinha dela, ela vendia tudo, e ela mostrava pra mim o saquinho cheio de tostões. Mas ela gostava mesmo era de estudar. E depois que passou para quatorze quinze anos foi só pro estudo. Nunca perdeu um ano só me dá gosto (CARVALHO, 1995, p. 86).

Ainda nesta dissertação, Carvalho fala que Crispina “não ia criar filha pra ficar fazendo figura” (CARVALHO, 1995, p. 86). Ou seja, a artesã desejava um futuro melhor para sua filha, alicerçado na educação e diferente do seu. Hoje Crispina é sustentada pela sua filha que é professora de Língua Portuguesa no Ensino Médio e não quer mais que ela trabalhe.
Ela foi a única de suas irmãs que não aprendeu a ler. Ela conta para Carvalho: “Quando ia pra escola, se visse um pa-vão, um boi, uma moça de cu-lote, eu corria pra casa e fazia uma figura igual. Eu só queria saber mesmo era de amassar o barro. Deixava de almoçar pra trabalhar no barro, minha filha. Por causa disso nunca aprendi a ler” (CAR-VALHO, 1995, p. 86).
A artista teve inspi-ração para criar suas obras na sua vivência na zona rural e, pos-teriormente no ambi-ente urbano da cidade de Feira de Santana-Ba. Segundo Dórea (2004), apesar do “arrependimento da ceramista por não ter aprendido a ler na é-poca em que teve oportunida-de, o depoimento revela o seu apego, desde cedo, a uma ati-vidade que a acompanharia praticamente por toda a vida: a modelagem de pequenas fi-guras de barro para o presé-pio” (DÓREA, 2004, p. 101).
Crispina não mais faz sua arte, já que sua saúde está ca-da vez mais debilitada. Sua o-bra pode ser encontrada no Museu Casa do Sertão (MCS), no campus da Universidade Es-tadual de Feira de Santana (UEFS), onde há uma sala, a sala do artesanato, que recebe seu nome como uma forma de homenageá-la.
A artesã, que nas suas vendas tinha uma forma de com-plementar o sustento de sua casa, além de levar objetos utilitários, levava também pa-ra comercializar sua arte, a-través dos presépios natali-nos, mostrando também a re-ligiosidade do sertanejo. No entanto, a tradição de montar presépios vai sendo perdido com o tempo. A obra de Cris-pina dos Santos pode ser en-contrada no MCS ou com al-guns poucos colecionadores, todavia, seu trabalho tende a desaparecer, segundo Dórea, já que são feitos de barro, que é um material muito frá-gil, apesar de todo o cuidado tido para sua conservação no MCS.
Para Dórea (2004), uma das coisas que diferencia Cris-pina dos Santos das outras artesãs é que “suas peças al-cançaram um nível expressio-nal comparável ao dos gran-des ceramistas brasilei-ros” (DÓREA, 2004, p. 104).
Há na maioria dos presépios elementos fundamentais e que não podem faltar, como, por exemplo: “o Menino, o boi, o burro, os anjos, os pas-tores, Maria, José, os reis ma-gos, a estrela e a gruta ou manjedoura” (DÓREA, 2004, p. 105). No entanto, nos pre-sépios de Crispina dos Santos há apenas o menino Jesus, o pastor, o anjo, os magos e o boi. Nota-se a falta de Maria e José. Ela justifica isso dizendo: “Eu não gostava de fazer por que... santo, agente fazer... fazer Nosso Senhor de bar-ro!... Aí eu dizia: não faço não, que é um pecado... eu tinha medo (SANTOS apud DÓREA, 2004, p. 105).
Apesar disso, Crispina a-crescenta, nos seus presépios, elementos regionais, por e-xemplo: animais (galinha, cá-gado, pavão, jumento, carnei-ro, etc.), mulheres trabalhan-do (pilando milho, carregando cestas de frutas etc.), vaquei-ro, violeiro, caboclo, anjo, Pa-pai Noel, sereia, baiana, padre etc.
Inicialmente, a venda de su-as peças era feita no Mercado Municipal, no centro de Feira de Santana-BA, e depois, no centro de abasteci-mento. No entanto, Crispina muitas vezes não tinha paz para montar sua barraca por conta dos ficais, já que ela era ambulan-te.
Antes de parar de fazer as peças, vendia em sua casa, localiza-da no bairro feirense Tanque da Nação. Esse é um pouco da história de uma arte-sã feirense que, quando se for, deixará um vazio na histó-ria de Feira de Santana.

Fonte: Núcleo de Investigações Transdisciplinares-NIT – Departamento de Educação/UEFS
Ano XII – Nº 24 – Ago./Nov. 2012 – Feira de Santana-BA – ISSN 2179-1139

Referências: 

CARVALHO, Vânia Bezerra. Presépio: Religião e arte no Recôncavo. UEFS: Feira de Santana-Ba, 1995.
DÓREA, Juraci. O presépio sertanejo de Crispina dos San-tos. Légua & meia: Revista de literatura e diversidade cultu-ral. Feira de Santana: UEFS,v. 3, nº 2, 2004, p. 101-114.

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