REFLEXÕES SOBRE O “SEGUNDO EU" EM CISNE NEGRO (BLACK SWAN) E PRISCILLA, A RAINHA DO DESERTO (THE ADVENTURES OF PRISCILLA, QUEEN OF THE DESERT): EM FOCO O MOVIMENTO (ARTÍSTICO/LITERÁRIO) ROMÂNTICO


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Para Hauser (1998)[1], o homem romântico tinha um “segundo eu” que não passava de uma das várias formas de fuga da realidade. Sendo assim, o [“segundo eu”], “trata-se do irresistível impulso para a instrospecção, a tendência maníaca de auto-observação e a compulsão do indivíduo a considerar-se amiúde um desconhecido, um estranho misteriosamente remoto” (HAUSER, p. 679, 1998). Ou seja, há um conflito entre dois eus (o primeiro eu e o segundo). Dessa forma, o primeiro eu seria aquele que pode ser mostrado à sociedade, pois é aceito. Já o “segundo eu” é aquele que deve ser escondido, pois não é aceito socialmente.
No filme Cisne Negro[1], este “segundo eu” pode ser verificado em Nina (Natalie Portman). Nina é uma bailarina norte-americana e recebe uma difícil e importante tarefa para executar na companhia de dança que ela faz parte, ambientado em Nova York: interpretar a Rainha Cisne, uma adaptação do “Lago dos Cisnes”.  Nesta adaptação, Nina terá que viver dois cisnes: um branco (que seria um cisne “bom”, pois o branco, neste contexto, representa a pureza) e um negro (que representa a maldade). Para Nina era fácil interpretar o cisne branco, pois sua personalidade, no cotidiano, era passiva e tranquila. No entanto, ser o cisne negro era um problema, já que este representava a “maldade” e a sensualidade. Sendo assim, o cisne negro pode ser visto como o “segundo eu”, pois o comportamento sensual e  maldoso é praticado às escondidas e sempre nos é reprimido. Nina, dessa forma, passa a lutar contra tudo que lhe foi ensinado durante a vida toda para poder conseguir representar  o cisne negro. Sendo assim, posso perceber um diálogo entre o “segundo eu” dos românticos do século XIX, sempre rejeitado, e o “segundo eu” trazido neste filme.
O filme Priscila, a rainha do deserto[1], conta a história de três amigos, dois homossexuais e um transexual: as drag queens Anthony (Hugo Weaving) e Adam (Guy Pearce) e a transexual Bernadette (Terence Stamp). A história é ambientada na Austrália e eles viajam num ônibus velho, apelidado de Priscila, para o interior do país para fazerem apresentações, em boates, travestidos de mulher. Eles saem da cidade como forma de fuga, pois, como é ainda hoje depois de tantas revoluções sociais, sofriam preconceito por serem gays e se vestirem “diferente”. Trago este filme para associar ao conceito, trazido por Hauser, de “segundo eu”, pois nascer com o sexo masculino, ou feminino, não se identificar com ele e travestir, para mim, também pode ser entendido como um “segundo eu”.  O “segundo eu” não era uma fuga para os românticos do século XIX? Sendo assim, ir de encontro à normatização da roupa masculina e usar roupas e acessórios femininos é uma forma de fugir da “realidade”.
Ao assistir a estes dois filmes já citados pude perceber o quanto o “segundo eu” está presente no dia a dia de inúmeras pessoas. Fugir da “realidade”, então, não ficou apenas no século XIX, pois no momento atual muitos buscam de várias formas burlas as leis sociais e inventar um cotidiano, parafraseando Certeau[1].



[1] CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. Artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1994.


[1] Título original: The Adventures of Priscilla, Queen of the Desert.  Ano de produção: 1994. Direção: Stephan Elliott. Tempo de duração: 1h 44 min. Distribuidor: Fox Filme. Acessado em http://www.adorocinema.com/filmes/filme-11316/, no dia 25 de abril de 2013. 



[1] Título original: Black Swan. Ano de produção: 2011.  Direção: Darren Aronofsky. Tempo de duração: 1 h 43 minutos. Distribuidor: Fox Filme. Acessado em http://www.adorocinema.com/filmes/filme-125828/, no dia 25 de abril de 2013.  



[1] HAUSER, Alnold. História social da arte e da literatura / Arnold Hauser (1892): [Tradução Álvaro Cabral]. – São Paulo: Martins Fonte, 1998. 

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